segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Visita de Andréia Carvalho Gavita




Nos poemas de Andréia Carvalho Gavita sempre gravitam mitologias - é por essa via que ela se aproxima do mundo e o reinterpreta em sinais. Ou seja, entre você e o mundo, o mito se ergue como a possibilidade do significado. Existem avisos que iludem, como aquele na entrada de Auschiwitz - "Arbeit macht frei" (o trabalho liberta). E os avisos que dizem um caminho, como no pórtico, na antecâmara de seu blog - Hábito Escarlate - está escrito: "o antigo costume de vestir-se com palavras vermelhas e caminhar pelo branco". No antigo templo de Delfos podia-se ler a inscrição: "te advirto, oh tu, que desejas sondar os mistérios da natureza: como esperas encontrar outras excelências se ignoras as excelências de tua própria casa? Em ti está oculto o tesouro dos tesouros. Oh, homem! Conhece-te a ti mesmo, e conhecerás o Universo e os deuses." Daí o vestir-se de palavras vermelhas, tornar-se o rubro, arder e assim desenhar no caminho branco os sentidos possíveis, a partir de si mesma, ligados à vida, reelaborando mitos, redesenhando o existir no mundo talvez em ruínas.

(os dois poemas abaixo podem ser lidos também no blog de Andreia - Hábito Escarlate )




Lingua Ferina

os leões rugem
e me mergulho
na órbita daquele aviso

não entrarás

rugidos partem meu escafandro
e me sufoco
no sumo daquela euforia

e me debato
nos átomos de carbono

não acidificarás

e me respiro
entrando

sou um leão alado
no dorso
pêlo cio de archotes
lança chama,
a cabeleira neutra

imersa no vôo que me ruge
escrevo
uma vírgula
insurreta

pendente da boca do felino


Screen Saver


a mãe
esverdeada
apagava a luz
com seu parto escuro
na trava das portas

aguardava
temor-esperança
a dança dos espectros
abaixo da cama
a infância perpétua
os entes sem avós,
sem batismo, sem eu

o mar de campânulas
com seres de lugar nenhum
soava dentro da harmonia negra
abafando a metálica
voz
da catedral
sempre exorcizada

mãe, fantasmas,
e o combustível
do espetacular
no limbo do sono reparador

o dia, apenas uma metáfora luminosa
no olho do grito fechado

3 comentários:

Ana Cau disse...

Amei tudo!!!

Aldemar Norek disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Nuno Rau disse...

Que beleza, não é, Ana Cau?

Vale visitar tbm o blog da Andréia.

Sem moderação.

:)

Obrigado pela presença em meu bangalô virtual...